16/04/2025 08:44
Por André Ricardo Costa*
Por que o Polo de Cosméticos nunca cumpriu o prometido em termos de geração de valor e empregos no Polo Industrial de Manaus? Responder a esta pergunta pode nos levar a quem lucra muito com o nome Amazônia e pouco contribui com o nosso desenvolvimento. Enquanto se chega à resposta é necessário recordar que quem investe no Polo Industrial de Manaus contribui para os 97% de bioma preservado no segmento ocidental da Amazônia.
A indústria de cosméticos emprega no Brasil 58 mil pessoas. 28 mil somente em São Paulo. No Amazonas, há apenas 55 trabalhadores. Entre as empresas nacionais com informações publicamente disponíveis, destaca-se a Natura e seus atuais R$ 24 bilhões em vendas e R$ 9 bilhões em prejuízo. Em 2023 as vendas internas são de R$ 19 bilhões, seu resultado fora um lucro de R$ 3 bilhões. Vejamos o caso em detalhes.
Em suas campanhas publicitárias e construção de marcas, a Natura alardeia o uso de matérias-primas amazônicas como um fator de qualidade de seus cosméticos e sustentabilidade de suas operações. Em seu último relatório de sustentabilidade, referente ao ano de 2023 e publicado apenas em inglês, a Natura relata estar colaborando para preservar 2,2 milhões de hectares de floresta, engajar 62 milhões de pessoas na causa amazônica, e relacionar-se com 44 comunidades agroextrativistas, de quem, destaca-se: Adquire R$ 35 milhões em ingredientes.
Repita e acrescente, em 2023 a Natura faturou R$ 19 bilhões, seus produtos custaram R$ 7 bilhões, correspondendo a mais de R$ 5 bilhões de aquisições de insumos, mas apenas R$ 35 milhões foram para adquirir insumos amazônicos de comunidades agroextrativistas. A margem bruta da Natura é quase sempre superior a 60%. No preço de cada produto da Natura apenas 40% do valor se deve ao produto em si, a substância. O restante deve-se aos gastos com marketing, os gastos administrativos e a remuneração de capital. Em suma: A Natura tempera seus produtos com um pouquinho de matéria-prima amazônica e muita marca Amazônia. Põe isso no preço e busca o seu resultado.
Enquanto isso, para fabricar efetivamente na Amazônia, no Polo Industrial de Manaus, alguns dos produtos análogos aos da Natura, somente se poderia usufruir dos incentivos da Zona Franca de Manaus se em três anos o projeto alcançar 50% do uso de matéria-prima regional. É esse que requer o PPB de cosméticos, estabelecido pela Portaria MDIC 106/2011. É por esse motivo que as Naturas da vida preferem adquirir insumos amazônicos, apenas R$ 35 milhões, em comparação com despesas acima de R$ 5 bilhões em insumos amazônicos.
E de onde veio aquele prejuízo de 2024? De péssimas decisões alocativas. Enquanto nada no oceano azul da marca Amazônia, a Natura pôs-se a queimar recursos adquirindo empresas de péssima saúde financeira. Em 2017 adquiriu uma varejista britânica, The Body Shop, por R$ 5,5 bilhões, para em 2023 vender por R$ 1,2 bilhão e reconhecer quase R$ 8 bilhões em prejuízo pela sinergia frustrada com a antiga controlada. Em 2020 a Natura comprara a Avon por aproximadamente R$ 8 bilhões, quando a norte-americana tinha aproximadamente R$ 4,5 bilhões em passivo a descoberto.
Conclusão: A produção de cosméticos é um caminho de geração de valor negado ao PIM e condicionado a quem manipula com a marca Amazônia, mas pouco faz render ao desenvolvimento local e à preservação efetiva da floresta.
*É professor da UFAM.
Artigo publicado no Jornal do Commercio em 16/04/2025